A bailarina, ilustração por Matheus Ferreira (http://defrentepropc.blogspot.com.br/)
Ela tinha uma coisa com a vida. Um caso talvez. Uma gana por seus dias, quiçá. Saboreava, ardentemente, como quem se permite o queimor de um abrasivo sol de verão; como quem experimenta pela primeira vez um sorvete em pleno calor; como quem canta com toda a voz, gritos exacerbantes exasperados pelo ar. Há quem diga que ela era a própria vida. Por que ela brilhava? Por que ela ria solto?
E na corda bamba ela se equilibrava com os dois pés, as mãos esticadas no ar, o vento balançando suavemente os cabelos curtos.
Ela tinha qualquer coisa com a morte. Uma sintonia quem sabe. Coisas de subterfúgios. E tinha plena convicção, ou completa ideia, de como seria sua despedida final. Como receberia o beijo frio da dama escura enquanto seguraria sua mão gélida e, com um sorriso plácido, permitir-se-ia ser levada entre seus dedos até outro mundo sem nome.
Sentia-se quase vulgar quando falava sobre isso, mas ela era a própria morte também.
E, vivendo os dois personagens, enquanto capturava um pouco mais de tempo para saborear os dias de sol, ela flutuou entre espaços e, com espasmos quaisquer, subverteu-as.
Não era mais vida. Sequer morte. Era um estado limítrofe, talvez. Nada conseguiria encaixá-la em quadrados previamente designados.
Sorriu jocosa enquanto subia ao ar, o vento cada vez mais cálido. Sentia calor no lugar de frio e, muito quente, deixou-se passear pelo espaço, enquanto procurava outros lugares, outras possibilidades, outras vivências repletas de dubiedade.
E vinha-lhe, então, um pleno gosto de liberdade.
De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontemNasço amanhã
Ando onde há espaço:
– Meu tempo é quando.Vinicius de Moraes, Poética
Nasce uma poeta… a pequena Baeana, pra não esquecer de seu time, virou gente grande. Parabéns, lindo causo!
Ôun. Muito, muito obrigada primo. É que essa cabecinha vive criando situações. O jeito é vomitá-las. Sempre que possível. 🙂
Livre como é de direito suave de nascença áspera quando precisa ser 🙂 deixe que nossa esponja cefálica mergulhe em suas ideias 😀
Sinceramente, talvez não haja nada mais bonito do que desprender-se, estar solto. Mas sejamos ásperos nas nossas liberdades também querido. Uns cheiros.
Que delicia de texto, moça!
Ôun, muito obrigada! A recíproca é verdadeira!